“É constitucional a incidência do ISS no licenciamento ou na cessão de direito de uso de programas de computação desenvolvidos para clientes de forma personalizada, nos termos do subitem 1.05 da lista anexa à LC 116/03.“
Essa foi a tese de repercussão geral (Tema 590) aprovada por unanimidade pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento pelo Plenário virtual concluído no dia 03/12/2021.
No caso, a Tim Celular interpôs recurso extraordinário contra decisão do Tribunal de Justiça do Paraná que validou a incidência de ISS sobre contratos de licenciamento ou de cessão de programas de computador (software) desenvolvidos para clientes de forma personalizada.
JULGAMENTO DAS ADINS: ISS x ICMS
O relator do caso, ministro Dias Toffoli, apontou que, em fevereiro/2021, o Supremo decidiu que incide ISS, e não ICMS, nas operações de softwares (ADIs 1.945 e 5.659). De acordo com essa decisão, para fins de incidência do ISS, não interessa se o software é personalizado ou padronizado.
Naquela oportunidade os ministros analisaram duas ações. Em uma delas, a CNI – Confederação Nacional das Indústrias contesta o parágrafo 6º do artigo 25 da lei 7.098/98, do Estado do Mato Grosso, que estabeleceu diferença tributária no crédito de ICMS. Para a Confederação, o dispositivo contraria a Constituição Federal, pois gerou “cumulatividade do imposto nas aquisições interestaduais”, sobretudo em razão de já estarem arroladas no âmbito de incidência do ISS.
Já na outra ação, a CNS – Confederação Nacional de Serviços pede a declaração de inconstitucionalidade do decreto 46.877/15, de Minas Gerais. A legislação questionada, diz a CNS, fez com que empresas prestadoras de serviços de processamento de dados e serviços de informática, como as filiadas aos sindicatos e federações vinculadas à autora, passassem a ser submetidas ao recolhimento do ICMS sobre as operações com programas de computador.
“Isso é, existindo o licenciamento ou a cessão de direito de uso de programa de computação, deve incidir o imposto municipal, independentemente de o software ser de um ou de outro tipo“, declarou o magistrado.
A seu ver, a decisão do TJ-PR de validar a incidência do ISS no licenciamento de programa de computador desenvolvido para a TIM não diverge da orientação do Supremo. Portanto, Toffoli votou para negar o recurso da empresa.
MODULAÇÃO DOS EFEITOS
Dias Toffoli sugeriu que a decisão retroaja a 3 de março de 2021, data em que foram publicadas as atas de julgamento das ADIs 1.945 e 5.659 (nas quais o STF decidiu que incide ISS, e não ICMS, nas operações de softwares).
Dessa forma, contribuintes que recolheram ICMS, até 2 de março de 2021, nas operações de software personalizado não terão direito à restituição do tributo. Nesses casos, municípios não poderão cobrar ISS, sob pena de bitributação. Além disso, estados não poderão cobrar ICMS em relação aos fatos geradores ocorridos até tal data.
Ficam ressalvadas as ações judiciais em curso até 2 de março de 2021, inclusive as de repetição de indébito e as execuções fiscais que discutam a incidência de ICMS, e as hipóteses de comprovada bitributação relativas a fatos geradores ocorridos até a mesma data, casos em que o contribuinte terá direito à restituição de ICMS, respeitado o prazo prescricional, independentemente da propositura de ação judicial até tal data.
E, no caso de não recolhimento do ICMS ou do ISS, incide o ISS em relação aos fatos geradores ocorridos até 2 de março de 2021.
COMO VOTARAM OS MINISTROS
O ministro Dias Toffoli, relator de uma das ações, entendeu pela incidência exclusiva do imposto municipal (ISS) tanto no licenciamento, como na cessão de direito de uso de programas de computador. Toffoli frisou que os programas de computador são utilitários e imateriais, portanto, não são mercadorias, o que excluiria a incidência de ICMS.
O ministro Alexandre de Moraes entendeu da mesma forma. Para o ministro, os softwares são pacotes de serviços. “Não me parece que possa, nos termos da CF, incidir o ICMS“, disse o ministro ao observar que o caso trata de uma prestação dinâmica de serviço.
O ministro Luís Roberto Barroso explicou que, na disponibilização online – sem cessão definitiva do programa de computador – o usuário remunera o detentor da licença, mediante pagamentos periódicos em regime de assinatura e, portanto, não há transferência da titularidade do bem a ensejar o ICMS.
A ministra Rosa Weber entendeu que o licenciamento do uso de computador não se confunde como uma operação de circulação de mercadoria, em especial na condição de artefato intelectual, regido pelo mesmo regime às obras literárias, pois o uso de programas de computador é objeto de contrato de licença.
Para Lewandowski, o tributo que deve incidir sobre a operação é o ISS. O ministro trouxe como exemplo os programas que vêm instalados nos smartphones e disse que quando os consumidores adquirem um software não estão adquirindo uma mercadoria, um bem corpóreo, mas estão comprando um serviço, que pode ser objeto de diversas atualizações.
O ministro Marco Aurélio afastou do campo de incidência do ICMS o licenciamento e a cessão do direito de uso de software, assim como o relator. No entanto, entendeu que não se deve modular os efeitos.
O ministro Luiz Fux entendeu pela incidência exclusiva do ISS nas operações com software. Fux rememorou ações de sua relatoria sobre a incidência de ISS nos planos de saúde. Segundo presidente da Corte, estes temas envolvem não só conceitos de Direito Privado, mas também de Direito Constitucional.
Para o ministro Edson Fachin, os programas de computador são mercadorias, e, portanto, o ICMS deve incidir. O ministro entendeu que os softwares são produtos de criação intelectual e que, quando esta criação é produzida em série (em massa) para ser comercializado, a destinação e o objetivo da operação passam a ser a circulação, a venda e o lucro, incidindo o ICMS.
A ministra Cármen Lúcia afirmou que programas de computador não são equivalentes a uma prestação de serviços. “As operações mercantis que façam circular licenças ou cessões de uso de determinados programas de computador, permitem a incidência do ICMS”, concluiu.
O ministro Nunes Marques questionou: “é possível a incidência de ICMS sobre a circulação de mercadoria virtual?” Para o ministro, a resposta é positiva. O software, segundo o ministro, se configura como um bem (mercadoria), ainda que seja virtual e, por isso, o ICMS deve incidir. “É um produto pronto e acabado (…) colocado em circulação“.
O ministro Gilmar Mendes entendeu pela incidência do ISS sobre softwares desenvolvidos de forma personalizada e pela do ICMS sobre software padronizado, comercializado em escala industrial. O ministro julgou improcedente o pedido, na compreensão da possibilidade de incidência do ICMS no licenciamento ou cessão de direito do uso de programas de computador.