TRT4 entende que cláusula viola direito de ação e homologa acordo apenas parcialmente. Advogados discordam
A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4) manteve a decisão do juiz Almiro Eduardo de Almeida, da 2ª Vara do Trabalho de Santa Cruz do Sul, de homologação parcial de um acordo extrajudicial celebrado entre um trabalhador e a Philip Morris Brasil.
O magistrado prolator da sentença excluiu do ajuste a cláusula que daria quitação total do contrato de trabalho, chancelando apenas as parcelas discriminadas expressamente. Diante do entendimento do juiz, as partes apelaram em conjunto ao TRT4, sob o argumento de que, não deferida a homologação integral, caberia a rejeição total do acordo.
Para o relator do processo, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, “a pretensão de homologação de acordo extrajudicial em que se propõe a quitação geral relativa ao contrato de trabalho configura inegável prejuízo ao trabalhador, por caracterizar a renúncia de direitos básicos, afetando, em especial, o direito fundamental do indivíduo ao acesso à justiça (artigo 5º, XXXV, da CF/88), ou seja, de buscar a tutela jurisdicional de eventuais questões sobre as quais surjam controvérsia”.
O desembargador ainda entende que “também verifica-se violação, pelos termos em que apresentado o acordo, ao previsto no artigo 477, § 2º, da CLT e ao o princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas”.
De acordo com Alexandre Corrêa da Cruz, o empregado figura como parte vulnerável diante do empregador, o qual detém melhores meios de apurar a real satisfação da integralidade dos direitos daquele ao longo do contrato.
O relator também argumentou que “caso se homologasse o acordo extrajudicial, medida que inicialmente aparentaria como favorável ao empregado em virtude do rápido recebimento da quantia proposta, a constatação posterior de insatisfação integral de seus direitos, podendo consubstanciar quantia substancialmente superior à acordada, não poderia ser levada ao Judiciário”.
Dessa forma, “a transação elaborada pelas partes ofende noções básicas do Direito do Trabalho como ramo protetivo, destacando-se o Princípio da Indisponibilidade, além de contrariar diretamente a garantia constitucional do Direito de Ação. A ofensa a princípios também insere-se na avaliação da legalidade do objeto”, conclui Alexandre Corrêa da Cruz ao defender, no caso discutido, a extinção do processo sem resolução de mérito.
No entanto, para as demais integrantes da 3ª Turma, desembargadoras Maria Silvana Rotta Tedesco e Maria Madalena Telesca, o acordo deveria ser homologado de forma parcial, como decidido em primeira instância. Isso porque, embora as magistradas considerem que a cláusula de quitação geral fere o princípio do acesso à Justiça, a homologação parcial, que exclui essa parte do acordo, seria benéfica ao trabalhador, já que possibilitaria o recebimento do montante acordado, sem qualquer tipo de prejuízo. Leia a íntegra da decisão do TRT4 que excluiu a cláusula de quitação total.
O que diz a reforma trabalhista sobre os acordos extrajudiciais
De acordo com o entendimento de André Ribeiro, sócio da Dias Carneiro Advogados, a decisão ofende o que está previsto no artigo 855-B da CLT, que foi incluído no código pela reforma trabalhista. “O juiz não pode partir do pressuposto que o empregado está sendo enganado e que não tem a capacidade de negociar”. Para o advogado, se o magistrado entender que, de fato, o empregado foi instruído e que as condições do acordo extrajudicial ficaram claras, ele teria a obrigação de homologar o acordo nos termos apresentados. “O juiz jamais pode substituir a vontade das partes num processo de jurisdição voluntária”, defende.
Ribeiro também afirma que a decisão é tecnicamente equivocada, “o juiz não pode delegar contra apenas por discordar da lei. Isso é inválido, deve haver fundamentação. O que ele tem liberdade de convencimento é: existe ou não fraude ou vício de vontade. O acordo é nulo, porque a parte não sabe o que está assinando”.
Alexandre de Almeida Cardoso, sócio na área trabalhista do Tozzini Freire Advogados, pensa de forma semelhante. “O procedimento deste acordo extrajudicial deixa muito claro que cada parte vai ter um advogado. Então, afasta a crítica de que o trabalhador é uma parte vulnerável em relação ao empregador”, opina o advogado.
A quitação geral, afirma Cardoso, é uma própria previsão da lei, que deveria trazer segurança jurídica ao empregador depois da negociação das condições do acordo. “Quando o juiz suprime cláusulas do acordo, no meu entendimento, está mudando o que foi consentido entre as partes”, critica.
A tendência para o futuro, aponta Cardoso, é que a Justiça Trabalhista passe a aplicar a norma sobre os acordos extrajudiciais da maneira como está prevista, já que o Superior Tribunal de Justiça já tem ao menos uma decisão em que homologa a quitação geral de acordo extrajudicial. Fonte: JOTA
Opinião
A decisão singular, confirmada pelo TRT4, é totalmente descabida, viola a vontade das partes, viola a previsão legal do acordo extrajudicial e, pior, busca esvaziar essa modalidade de solução de conflito.
A decisão gera insegurança jurídica, pois as partes, através da quitação total do contrato de trabalho estariam cientes da efetiva conclusão de qualquer imbróglio. Agora, ao afastar a quitação integral por meio de acordo extrajudicial, a decisão desnatura a ideia de solução definitiva, fazendo com que a opção pelo ajuizamento de reclamatória trabalhista com posterior acordo em audiência volte a ser caminho mais seguro, todavia, mais caro, mais demorado, mais custos para todos.
TST
Segundo a 4ª Turma do TST, ao avaliar um recurso sobre o tema , um magistrado não pode fazer a homologação parcial – ratificar apenas parte do acordo, caso não considere válidos alguns itens, mesmo quando empregador e empregado tenham se entendido.
Pela decisão, o magistrado deve validar ou recursar integralmente o acordo. Uma homologação parcial permitiria ao trabalhador, por exemplo, mesmo com o acordo extrajudicial avalizado pela Justiça do Trabalho, entrar posteriormente com uma ação trabalhista.
Acórdão relatado pelo ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho muda entendimento de primeira instância e do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (TRT-2). O caso concreto envolve uma trabalhadora e uma empresa do setor farmacêutico. A Corte regional afirma que esse acerto “não se reveste de validade”. De acordo com o TRT-2, foi apontada apenas uma quantia global de indenização. Teria faltado, portanto, segundo o tribunal paulista, a especificação de cada verba.